
O setor de viagens corporativas no Brasil está em plena expansão em 2025. Segundo a Global Business Travel Association (GBTA), os gastos globais com viagens de negócios devem chegar a US$ 1,57 trilhão, com o Brasil entre os dez maiores mercados mundiais, movimentando cerca de US$ 30,4 bilhões neste ano.
Segundo o Levantamento de Viagens Corporativas (LVC) da FecomercioSP/Alagev apontou que o setor faturou R$ 32,7 bilhões no 1º trimestre de 2025, um crescimento de 6,8% em relação ao ano anterior. Esses números não apenas confirmam o dinamismo do mercado, mas também reforçam a importância de profissionais especializados em sua gestão.
Contudo, o papel do gestor de viagens ainda é subestimado em muitas organizações, mesmo com sua crescente relevância estratégica. Em um cenário onde empresas estão cada vez mais orientadas à eficiência, economia e governança, esse profissional precisa ser mais do que um executor: ele deve atuar como um facilitador de decisões e um agente de transformação.
Atribuições do gestor de viagens corporativas
De acordo com Demetrius Miguel, Diretor de Novos Negócios da Dynamic Travel, o gestor de viagens possui responsabilidades multifacetadas e altamente estratégicas. Entre as principais atividades, estão:
• Promover a visibilidade e valorização do programa de viagens dentro da organização;
• Controlar e atualizar a política de viagens;
• Implementar boas práticas, processos eficientes e alinhados ao negócio, em conjunto com a TMC (Travel Management Company);
• Investir em rodadas de negociação com fornecedores, porém a TMC fica responsável por buscar oportunidades de economia e apresentar para o gestor alternativas para reduzir custos e melhorar a experiência de seus viajantes, acompanhando a performance e efetividade dos acordos firmados periodicamente;
• Monitorar e analisar indicadores de performance e satisfação;
• Engajar lideranças e formadores de opinião internos para reconhecerem a importância da função;
• Disseminar conhecimento e informações relevantes, com base em dados, estudos de mercado e benchmarks.
Principais desafios enfrentados por gestores de viagens
Acúmulo de funções: muitas empresas não possuem um profissional exclusivo para gestão de viagens, o que limita a atuação estratégica, foco e dedicação. Em diversos casos, essa responsabilidade é atribuída a profissionais de diferentes níveis hierárquicos, desde diretores até estagiários ou recepcionistas.
Dificuldade de apresentar resultados: mesmo realizando análises, controlando indicadores e garantindo conformidade com políticas internas, muitos gestores não conseguem dar visibilidade ao seu trabalho.
A recomendação é clara: o gestor precisa trazer dados, apresentar benchmarks e compartilhar melhores práticas do mercado para ganhar relevância e reconhecimento.
Comunicação e informação: o gestor de viagens corporativas precisa manter-se atualizado com informações relevantes do mercado. Uma das alternativas para trabalhar isso de forma ativa é participar de eventos do setor, consumir conteúdo de portais especializados e estar em constante contato com a TMC são formas de manter-se relevante. Infelizmente, há empresas que ainda vetam a participação de seus gestores em eventos do setor, o que representa uma barreira importante à evolução desse profissional.
Falta de processos estruturados: Ausência de método, política de viagens desatualizada, falta de organização e comunicação assertiva, falta de sistemas e governança desestruturada comprometem a qualidade da gestão.
Cultura focada apenas em preço: Muitas empresas priorizam custos imediatos e ignoram aspectos como qualidade, segurança e conformidade legal.

“Temos vários exemplos de empresas que compram preço, elas não compram o serviço, elas não querem comprar um conjunto de soluções e etc. Eles estão comprando preço e às vezes comprar preço sai caro. Sabemos disso e o gestor às vezes enxerga isso, só que ele não consegue mudar essa cultura internamente, porque ele não tem elementos, ele não tem embasamento suficiente para ir lá junto a um departamento de compras ou junto a liderança da empresa, diretoria e conseguir fazer a migração para um processo que lhe passe mais segurança, que lhe entregue mais resultados, que esteja em conformidade com aspectos legais, tributários, que esteja enquadrado dentro do ESG e assim por diante. Então, a vida do gestor não é fácil, mas quando ele consegue exercer sua função de maneira plena, tendo o apoio da empresa, eu tenho certeza que o resultado obtido é muito grande e valioso para as empresas.”
– Demetrius Miguel, Diretor de Novos Negócios da Dynamic Travel
A parceria efetiva entre gestor e TMC é determinante para o sucesso. A relação precisa ir além da dinâmica cliente-fornecedor e assumir um formato colaborativo, onde ambas as partes compartilham responsabilidades e metas.
“O gestor é uma extensão da TMC dentro da empresa, assim como o executivo de contas é um braço do cliente dentro da TMC”.
– Demetrius Miguel, Diretor de Novos Negócios da Dynamic Travel
Pilares da atuação para se tornar um gestor de viagens ainda mais estratégico
1. Pilar Operacional
- Definir e acompanhar níveis de serviço, ou seja, estabelecer SLAs claros que atendem o público interno sem gerar impacto operacional da própria empresa;
- Avaliar a satisfação do público interno, investindo em uma comunicação direta e assertiva com todas as camadas;
- Esclarecer aos colaboradores o que está previsto no modelo de atendimento para evitar percepções equivocadas sobre a qualidade do serviço;
- Investir em capacitação e workshops de conhecimento em conjunto com a TMC a fim de esclarecer temas sensíveis e dúvidas operacionais.
2. Pilar Estratégico
- Monitorar KPIs relevantes, como saving por acordo, desvio de política, antecedência de compra, lost savings e compliance;
- Utilizar dados históricos para demonstrar a evolução do programa de viagens e justificar decisões futuras;
- Acompanhar rodadas de negociação com base em análises comparativas de mercado e performance de fornecedores, avaliar continuamente a efetividade dos acordos firmados (ex: comparar tarifas negociadas com tarifas médias efetivas);
- Reagir com agilidade quando houver distorções entre o que foi negociado e o que está sendo entregue.
Demetrius cita, por exemplo, a necessidade de monitorar a aplicação dos acordos corporativos vigentes. Muitas vezes o cliente pode ter uma tarifa negociada de R$350,00 num hotel, porém nos relatórios a tarifa média deste hotel está acima de R$400,00. Se isso acontece certamente há alguma falha, podendo ser no processo operacional, no modelo de acordo estabelecido, no carregamento das tarifas, no canal de distribuição, entre outros. A iniciativa de revisão deve partir da TMC, mas cabe ao gestor estar atento e acompanhar estas revisões.
- Investir tempo em análises e estratégias para conversas, reflexões sobre o processo gerencial de viagens, além de ter um relacionamento estratégico com a TMC para melhorias constantes que reflitam em redução de custos, redução de problemas, elevar experiencia dos viajantes e levar conhecimento de alto nível para os solicitantes e viajantes.
3. Pilar de Governança
- Gestão de riscos (trabalhistas e de segurança) relacionados às viagens (ex: embarques recorrentes em horários inadequados, hospedagens em regiões de alto índice de violência);
- Garantir que políticas estejam em conformidade com a legislação fiscal e trabalhista;
- Monitorar a conduta da TMC quanto às práticas de contratação (ex: regime PJ generalizado e ausência de benefícios trabalhistas);
- Valorizar TMCs éticas e seguras que passam por auditorias externas aprovadas sem ressalvas e que possuem práticas alinhadas ao ESG;
- Analisar se sua TMC cumpre obrigações fiscais (como recolhimento de impostos);
- Atuar como guardião da ética nas contratações, evitando práticas questionáveis.
Demetrius destaca que a governança vai além da conformidade legal, ela envolve também uma postura responsável, social e ambiental. O gestor deve ter um olhar 360º sobre o impacto dos contratos firmados pela empresa. A escolha de fornecedores que atuam com más práticas pode comprometer a imagem da empresa cliente e trazer riscos para o negócio.
A gestão de viagens corporativas exige uma abordagem muito mais ampla do que tradicionalmente se imagina. Profissionais dessa área precisam dominar aspectos operacionais, estratégicos e de governança, ao mesmo tempo em que constroem relações colaborativas com parceiros e lideranças internas.
Demetrius Miguel reforça que, o gestor estratégico é aquele que vai além da execução e atua como guardião de indicadores, custos, riscos e boas práticas. É ele quem garante que o programa de viagens contribua para a performance global da organização, de forma eficiente, segura e ética.
Gestores que conseguem evidenciar seus resultados e manter uma postura técnica, colaborativa e ética tendem a ganhar relevância dentro das empresas. A valorização da área depende da capacidade de seus líderes demonstrarem, com clareza, o valor que a gestão de viagens agrega ao negócio.